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Síndrome da Impostora nas relações: você já se sentiu uma fraude no amor?

Soltos S.A.

07/09/2020 13h13

foto de Sydney Sims (unsplash)

Como se não bastasse as mulheres questionarem seu valor na vida profissional e viver eternamente com o alarme ligado na mais pura sensação "uma hora vão descobrir que eu não sou tudo isso e me trocar por alguém muito mais capacitado, inteligente e articulado", parece que a angústia da Síndrome da Impostora tem se estendido também para vida amorosa.

A Síndrome da Impostora no amor vem como uma espécie de remake pós-moderno do "ele é muita areia para o meu caminhãozinho". Agora o medo é ter se vendido como uma BMW do amor e ser flagrada como o tal caminhãozinho 1984 com a lataria já mais gasta do que aparentam as fotos. Nos tempos dos cardápios amorosos oferecidos nos apps de paquera e das vidas editadas no Instagram, é mais do que justificável que a gente esteja se enrolando na nossa própria fantasia. Mas acho interessante pensar como a gente se esquece que os filtros e as frases editadas são usadas tanto por nós como pelos crushes. Ou seja, de alguma forma somos todos impostores. Posto isso, por que será que a gente acha que só a nossa máscara vai cair?

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Bem-vinda ao "solteiros got talent"

No tal atacadão da solteirice, onde a escolha do início da paquera é feita em frações de segundo a partir da análise de 3 fotos suas e uma frase de bio, a sensação é de que estamos em um grande palco de "Solteiros got talent". O match piscou no seu visor? Relógio na tela! Sinto como se eu tivesse três balões de chat, uma hora e meia de papo presencial num date e dois envios fofos de fotos ou vídeos pra mostrar todo meu talento "mulheril paquerativo". Caso contrário, o pretendente abrirá outra "Porta da esperança" e me deixará pra sempre presa na "Porta dos Desesperados" das conversas inacabadas. Parece que se inicia uma contagem regressiva imaginária – já visualizo as bailarinas do Faustão apontando para o pulso ao fundo e a música do carnê do baú do Silvio Santos dando o tom urgente e dramático pra coisa (chuva de referência anos 80 né? Eu sou o tal caminhãozinho 1984, amores…).  

Nessa lógica absurda parece que só sermos nós mesmas não é suficiente. A gente fica querendo mostrar nossos melhores predicados e vai se afundando na ilusão de que precisaremos sempre recorrer a algumas armas secretas ou cartas na manga pra impressionar.

As tais cartas na manga 

O mercado de coaches amorosos tem lucrado horrores vendendo armas secretas. O que parece estratégia, pra mim acaba sendo um grande incentivador da tal "Síndrome da Impostora", pois a sensação é de que o enlace amoroso só aconteceu porque as mulheres aplicaram a técnica da "mensagem por engano" ou seguiram a "regra do triângulo".  A questão é: e quando acabam as 12 semanas do curso ou as páginas do e-book, como proceder? 

Apesar de ser avessa aos coaches, confesso que tenho minhas próprias cartas na manga. Eu já tô solteira há seis anos e se você também tem um tempo de pista como eu, aposto que também já criou seu "repertório de impacto". A gente já sabe quais são as cinco histórias de nossa vida que fazem os crushes rirem e acharem a gente divertida e inteligente; qual prato afrodisíaco conquista os sentidos; qual lingerie nos valoriza; quais filmes são boas sugestões pros primeiros domingos no sofá… É claro que cada crush é um crush e nem sempre a história de ter organizado a viagem surpresa dos 90 anos da minha avó vai sensibilizar todos os moços. Mas parte do processo de autoconhecimento é sacar quais são essas nossas melhores versões paquerativas. Em épocas onde passar do terceiro date é luxo, fica confortável e divertido requentar as mesmas frases de impacto. O problema é que às vezes sem nos darmos conta elas se tornam muletas.

Espontaneidade friamente calculada

O digital não só trouxe pra gente a possibilidade escolher quais partes de nossas vidas serão postadas para construir uma persona "intelectual-sensível-amante de plantas-conectada-com-física-quântica-colecionadora-de-louças-charmosas-de-cerâmica" como também nos permitiu brincar de "parar o tempo" pra analisar detalhadamente as palavras da mensagem do crush, stalkear seu feed até abril de 2013 e escolher o melhor banco de Gifs e figurinhas pra requentar um papo com leveza e bom humor. Nesse "Solteiros got talent" acabou o "quem sabe faz ao vivo". Aqui ganha pontos quem melhor brinca com os timmings e com as referências. 

Todas essas dinâmicas acima funcionam bem no início do flerte. Mas como proceder quando a história começa a engatar?

Intimidade: Deus me livre ou quem me dera?

Eu vivo reclamando que tá difícil passar do tal terceiro date mas a verdade é que dá um medo gigante de ver o que acontece depois que você tem que descer do palco, tirar a maquiagem e seguir a relação no improviso. 

Segundo a terapeuta Moraya DeGeare esse medo pode nos levar a duas posturas sabotadoras:

  1. Excesso de esforço – Rita Hayworth já falava " Os homens sempre vão para a cama sonhando com Gilda (personagem do filme) e se decepcionam ao acordar ao lado de Rita ". Queremos tanto ser Gildas que por vezes nos esforçamos demais em busca do tal ideal na relação. É aqui que a autocrítica explode e a espontaneidade manda um beijo. Essa sensação de que temos que performar sempre nos deixa tensas, ainda mais inseguras e provavelmente menos interessantes e autênticas. Por que achamos que nossas Ritas internas não são suficientes? Acordar com a Rita, com a Carol e com você pode ser maravilhoso, mas a gente se esquece disso.
  1. Distanciamento social amoroso – Pra evitar o risco de sermos "desmascaradas" muitas de nós acabam optando por não aprofundar nas conversas, nos afetos ou nas expectativas. Isso nos mantém naquelas relações mornas e frustrantes. A gente reclama que os caras não se abrem mas quando estamos imersas na síndrome da impostora, acabamos ocultando particularidades incríveis nossas porque temos medo que tudo seja julgado como inadequado.

Efeito rebote da paixão

A grande incoerência é que muitas vezes quanto mais o interesse sobe, mais a autoestima desce: uma das raízes centrais da Síndrome da Impostora é a insegurança e tenho percebido que ela aumenta na mesma proporção em que aumenta meu interesse pelos caras. Isso também acontece com vocês? Parece que o fato de eu estar apaixonada ou interessada por alguém automaticamente me joga pro tal palco do show de talentos e eu esqueço de toda minha soltura e empoderamento e me pego fazendo macaquices para ser escolhida. A psicóloga e psicanalista Valeska Zanello conta que fomos ensinadas a ter nossa identidade validada pelo olhar do homem. "Aprendemos que nosso atestado de mulherice só vem quando somos escolhidas" comenta Valeska. Por isso o medo gigante de ser eliminada. O pior é que quanto mais impostora a gente se sente mais sabota as relações para confirmar a ideia de que realmente não somos tão boas assim…

Tratamento de choque: Bora descer do palco e do salto?

Pra aplacar a tal Síndrome da Impostora amorosa tenho adotado uma técnica kamikaze e já começo abrindo minhas vulnerabilidades e convidando os crushes a dividirem as deles. Essa inclusive é uma das minhas perguntas na bio do Inner Circle, um app de relacionamento. Já falo assim: "aqui não é RH, se quer me impressionar não me conte suas qualidades, me conte uma vulnerabilidade sua". Tenho recebido chuvas de mensagens interessantes com histórias não instagramáveis. Isso me deixa mais confortável pra abrir as minhas também.

Se somos todos impostores do amor, por que não já escancarar os truques, descer do palco e se esbaldar no improviso do ao vivo?

Se você quer saber como sobreviver à solteirice em tempos de likes, segue a gente no YouTube e no Instagram. Toda semana a gente entrevista solteiros, especialistas e divide nossos aprendizados e teorias. Mande histórias e dilemas que a gente transforma em pauta!

Sobre os autores

Piranhas românticas, André e Carol são experts em solteirice e partidários do afeto mesmo nas relações casuais. Carol está solteira há 6 anos e já não troca a aula de hot yoga por um date mais ou menos. André está solto monogâmico mas já se esbaldou muito na vida de contatinhos. Publicitários e roteiristas, trabalham com comportamento e conteúdo há anos e decidiram se aprofundar no tema que é assunto da manicure à terapia: como se relacionar hoje em dia. Comunicadores, puxam assunto até com o poste e são formados como psicólogos de boteco. Há um ano eles conversam com todo tipo de solteiros e especialistas no soltos s.a. um canal de youtube, instagram e, agora blog, pra explorar as dores e delícias dessa vida solta. Ninguém entende de solteirice como eles: já foram convidados pra falar na Casa TPM, na GNT e no podcasts Mamilos e Sexoterapia (aqui em Universa).

Sobre o blog

Um espaço para trocar estratégias para sobreviver à solteirice e aos relacionamentos em tempos de likes. Quando vale ter uma DR e quando podemos deixar morrer no silêncio? O que significa esse emoji? Assistir stories significa? Experts em solteirice e ótimos psicólogos de boteco, André e Carol compartilham dilemas reais de solteiros e mapeiam possíveis caminhos para não perder a sanidade mental nessa era de contatinhos.