O dia em que fui trocada pela Luana Piovani
Soltos S.A.
09/03/2020 04h00
Talvez você tenha sido impactada por um artigo maravilhoso que saiu no NY Times nos últimos dias: A nova namorada do meu ex-namorado é a Lady Gaga. Pois é, queridas. A jornalista anônima e reles mortal Lindsay Crouse teve que se deparar com uma chuva de matérias, mensagens em grupos de Whatsapp e likes no Instagram constatando que uma das mulheres mais famosas do mundo estava sentada no colo do seu ex-namorado. Ele é o novo eleito da diva pop. Se você leu a matéria, viu que Lindsay arrasou e fez do limão uma limonada (se ainda não leu, vale conferir. É inspirador!). Mas, apesar de toda maturidade emocional da jornalista, rola nessa história um fator atenuente: ele era EX-NAMORADO, daquelas histórias já passadas e bem resolvidas.
Como proceder quando o seu ATUAL NAMORADO te troca pela mulher mais cobiçada do Brasil? Então, amores, rolou comigo. FUI TROCADA PELA LUANA PIOVANI. Luana Piovani bem naquela época capa de revista masculina e de "A Mulher Invisível", em que ela enlouquecia o Selton Mello e a torcida do Flamengo com suas cenas exuberantes de lingerie e seu olhar matador. Estava eu ali, fazendo das tripas coração para tentar reapimentar um namoro que estava na corda bamba e, após um final de semana que incluiu previsões de um pai de santo, carona com semi-estranhos para o Rio de Janeiro e endividamento por compra de um ovo de Páscoa gigante da Kopenhagen, recebo essa notícia bomba da boca do dito cujo.
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Diferentemente da Lindsay, não levei o toco tão na esportiva. Penei bastante pra recolher os caquinhos e tentar reconstruir a autoestima para que ela chegasse naquele índice mínimo necessário para poder voltar a cruzar olhares na rua ou abrir revistas de fofoca sem medo de encarar notícias-bomba. Sim, passei uns seis meses indo na manicure e morrendo de medo de abrir aquelas revistas de fofoca e me deparar com uma foto do novo casal feliz na Ilha de Caras e um título matador como "Luana e Fulano celebram seu intenso amor" ou "Luana e Fulano vão crescer a família". Antes do baque, já tinha ouvido uma entrevista dela falando sobre filhos, e minha neura era ter que lidar não só com o fato de ter sido traída pela celebridade, como ter que me deparar com as fotos dos novos bebês pseudofamosos inundando as mídias, os programas de TV e, obviamente, o papo das minhas tias velhas nos almoços de família. (ESCLARECIMENTO IMPORTANTE: esse "Fulano" em questão não atende pelo nome Pedro Scooby.)
FAZENDO UM RÁPIDO FEEDBACK DA HISTÓRIA
Adolescência anos 90 mundo cão
Se você como eu nasceu nos anos 80, sabe que ser morena de cabelo cacheado te deixava automaticamente fora do padrão de beleza. Não que eu seja uma pessoa feia, mas em épocas onde só existiam paquitas loiras, princesas da Disney loiras e alisamento com muito formol, era impossível se sentir atraente. Cresci naquela geração em que os garotos desejavam e se masturbavam com fotos da Feiticeira, Sheila Mello, Deborah Blando e, obviamente, da Luana Piovani. Elas simbolizavam tudo o que eu não era com aquele combo sensualidade, segurança e certeza de que poderiam atrair o homem que quisessem (pelo menos na minha fantasia).
Os anos foram passando e entendi que poderia me diferenciar com outras "armas". Talvez nunca fosse a Femme Fatale, mas me virei bem aprendendo a ser a amiga engraçada (que faz piadas autodepreciativas e tem boas tiradas de humor); a adolescente questionadora (que amava cinema alternativo e se vangloriava por estar lendo Sartre); a jovem adulta conectada com as artes e a comunicação. Achei que tinha achado meu espaço e passei a conviver bem com as beldades que seguiam estampando as capas de revista.
E eis que aparece o namorado intenso (e levemente tóxico)
Nessa reconquista da autoestima pintou o tal namorado Fulano. Dessas paixões intensas, cheias de declarações de amor e brigas dignas de novela. Passados dois anos permeados por rompantes de paixão e ciúmes – que incluíam cenas como um quarto cheios de velas vermelhas, cartas de amor e pedido pra morar juntos e um ataque de raiva e agressividade porque abaixei para pegar um banco numa festa e minha calcinha apareceu – ele terminou comigo. Fiquei devastada. Hoje vejo que não era dos namoros mais saudáveis, mas o amor era tão intenso que não conseguia me imaginar sem ele.
Tentando fazer a mulher madura e analisada, já juntava meus caquinhos rumo à superação do pé na bunda quando recebo o conselho de uma amiga: minha mãe tem um pai de santo ótimo, você deveria ir até ele. E lá fui eu. Os búzios diziam que eu tinha uma história de amor mal resolvida e que até sábado (estávamos numa terça-feira, lembro até hoje), aquele homem ia me procurar. Eu, que já estava no processo de viver o luto e recomeçar, despertei a louca mística e passei aquele cinco dias grudada no celular, à espera de uma mensagem do tal Fulano. A mensagem claramente não veio. Mas domingo, confiando nos búzios, e já despida da minha sensatez, o procurei. Rolou aquele revival básico e lá fomos nós retomar nossa conturbada história de amor.
A maldita área cinzenta
Só que dessa vez não voltamos oficialmente. Éramos QUASE namorados, mas não namorados – o que dava brecha para uma série de mal-entendidos e frustrações. Vivíamos um entremear de finais de semana românticos e despistadas básicas, daquelas onde eu já estava pronta com a minha malinha para dormir na casa dele e ouvia coisas do tipo: "Adorei nossa tarde juntos, linda, mas agora tenho uma festa e vou com os meus amigos". Eu não estava convidada. Para piorar a situação, a peça de teatro em que ele atuava foi convidada para uma temporada no Rio de Janeiro. Naquele momento eu só teria o meu meio namorado durante meia semana. Segundas, terças e quartas. Nada de "prime time". A pouca frequência com que nos víamos, a falta de definições e os meus devaneios sobre ele estar conhecendo pessoas descoladas e bronzeadas na cidade maravilhosa só piorava a situação do nosso QUASE namoro. Mas eu estava decidida a reconquistá-lo.
A ressurreição
Era Páscoa e eu decidi que ia fazer a ressurreição do meu relacionamento. Ia visitá-lo no Rio de Janeiro para um final de semana romântico. As passagens de avião já estavam caríssimas e os ônibus lotados. Passei horas no Facebook até encontrar um menino que tinha estudado com meu irmão na 5a série (e que não víamos desde então) que ia de carro para o Rio de Janeiro. Lá fui eu e minha cara de pau pedir carona. Passei oito horas no trânsito da Dutra tentando puxar assunto com pessoas que eu mal conhecia, mas pensava: vai valer a pena, vou voltar com definições de amor. Pra causar ainda mais impacto e conquistar o moço também pelo estômago, me endividei comprando um ovo de páscoa caríssimo da Kopenhagen. Aquele maior de todos, de Nhá Benta. Era o chocolate preferido dele. A minha conta no vermelho, e eu pensando: vai valer a pena, vou voltar com a ressurreição do meu namoro. Passamos três dias de puro amor, paz e bençãos. Muito bacalhau, vinho e chamego e até almoço na minha avó com ele fazendo a linha neto da família. Minha única escorregada foi: tinha esquecido o tal ovo de páscoa em São Paulo. Mas o clima estava tão bom que eu disse pra ele: "Volta logo segunda que eu tenho uma surpresa pra você". Encarei as dez horas de trânsito na Dutra com um sorriso no rosto. Já contando todos os detalhes da minha provável volta de namoro para o tal amigo do meu irmão.
A surpresa do meu kinder ovo do amor.
Segunda-feira chegou. Lingerie sexy e o enorme ovo de páscoa da Kopenhagen em mãos. É hoje, pensava eu, enquanto tocava a campainha. Ele abriu a porta prontamente. Eu, com um sorriso no rosto, estendi o ovo sensualizando. Já imaginava nós dois naquela cena de sexo de reconciliação lambuzados de chocolate caro e Nhá benta. Ele colocou o ovo de lado e veio com a fatídica frase: "Precisamos conversar". Quem já ouviu essa frase sabe que nada de bom virá depois dela. Ele veio com um papo dizendo que as coisas não tavam legais do jeito que estavam. Eu, em vez de já aceitar o pé na bunda previamente, ainda passei por aquela mini-humilhação de dizer "também acho. Essa indefinição está atrapalhando tudo. Vamos voltar a namorar oficialmente.". Silêncio. Aí veio toda DR clichê de quem prevê que foi traída. "Você se envolveu com alguém?", perguntei. Ele fez que sim com a cabeça. Comecei a repassar mentalmente todas as minhas possíveis concorrentes (eu sei, em tempos de sororidade não devemos competir…. Mas eu tava levando um pé na bunda, né?). Mapeei as mulheres que ensaiavam a nova peça com ele, as colegas da faculdade, as amigas da sua irmã mais nova… Em poucos segundos já tinha uma lista de cinco mulheres. Perguntei: "Eu conheço?". Ele mais uma vez fez que sim com a cabeça. Pronto, era uma das cinco. Eu poderia ter ido embora com o pouco que restava do meu amor próprio, mas não, preferi ficar e perguntar: "Qual o nome dela?" Luana, ele respondeu. Nenhum daquelas cinco se chamavam Luana. Não tinha nenhuma Luana na faculdade, na turma da irmã, nos ensaios. Não conhecia nenhuma Luana. Mas antes que pudesse responder a isso, ele completou. Luana Piovani. Fiquei totalmente sem reação.
Voltei para casa e não liguei a televisão com medo de encontrar aquela estante loira em algum comercial de shampoo. Naquele momento voltei a ser aquela adolescente que não era vista entre as amigas loiras da escola e as paquitas da TV. Parecia que de nada valia a minha inteligência o meu charme o meu bom humor, na hora do vamos ver eles iam sempre escolher as bonitas e sexys.
Levei algum tempo pra voltar a minha sanidade mental, recobrar minha autoestima e parar de ter medo de abrir as revistas de fofoca ao fazer as unhas. Hoje, lendo o texto da Lindsay gostaria de ter sido mais madura e empoderada na época. Queria que a Carolina de 20 e poucos anos soubesse que ter sido trocada por Luana Piovani não a faz menos mulherão. Que cada pessoa tem suas armas de sedução e se empoderar do que nós somos é a melhor coisa que podemos fazer por nós. Queria também que aquela Carolina entendesse que as coisas acabam e, às vezes, não adianta querer remendar histórias que já foram. Mas duas coisas aquela Carolina aprendeu direitinho: jamais ir a um pai de santo carente novamente nem gastar os tubos num ovo Kopenhagen para relações não definidas. Agora só um noivo ganha esse ovo, e olhe lá!
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Sobre os autores
Piranhas românticas, André e Carol são experts em solteirice e partidários do afeto mesmo nas relações casuais. Carol está solteira há 6 anos e já não troca a aula de hot yoga por um date mais ou menos. André está solto monogâmico mas já se esbaldou muito na vida de contatinhos. Publicitários e roteiristas, trabalham com comportamento e conteúdo há anos e decidiram se aprofundar no tema que é assunto da manicure à terapia: como se relacionar hoje em dia. Comunicadores, puxam assunto até com o poste e são formados como psicólogos de boteco. Há um ano eles conversam com todo tipo de solteiros e especialistas no soltos s.a. um canal de youtube, instagram e, agora blog, pra explorar as dores e delícias dessa vida solta. Ninguém entende de solteirice como eles: já foram convidados pra falar na Casa TPM, na GNT e no podcasts Mamilos e Sexoterapia (aqui em Universa).
Sobre o blog
Um espaço para trocar estratégias para sobreviver à solteirice e aos relacionamentos em tempos de likes. Quando vale ter uma DR e quando podemos deixar morrer no silêncio? O que significa esse emoji? Assistir stories significa? Experts em solteirice e ótimos psicólogos de boteco, André e Carol compartilham dilemas reais de solteiros e mapeiam possíveis caminhos para não perder a sanidade mental nessa era de contatinhos.