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Especialistas alertam: parem de usar apps de paquera como antidepressivos

Soltos S.A.

13/07/2020 04h00

fonte: unsplash

Dia cento e não sei quanto de isolamento. Domingo 2h45 da manhã. Mais uma insônia quarentênica pra conta. Abro o app de mindfulness que baixei no dia 52 após uma crise de choro e um ataque à geladeira e tento prestar atenção na minha respiração, mas meus pensamentos compulsivos falam mais alto que a voz do yoginni do app. Pra não ter que encarar minha própria angústia e o medo gigante de como vai ser o tal novo normal, troco de app e me jogo no puro escapismo solteiro: os apps de paquera. Confesso que eles têm sido meus melhores aliados para preencher todos os meus silêncios.

Ainda em março fiz um "extreme makeover" no meu celular e troquei apps agora inúteis como os de oferta de passagem aérea ou os de compra de ingresso de cinema, pelos apps que seriam meu passaporte pro flerte seguro. Lotei minha memória com todos os apps possíveis: Happn, Bumble Inner Circle, Okcupid, Tinder… no velho normal a gente não saia cada dia pra um bar diferente? Pois é… agora podia ir nesses 5 "bares virtuais" todos os dias. Achei que tava arrasando: assim q batia um vazio e uma mini angústia, ao invés de recorrer ao Prozac, me afundava no "joga pra direita, joga pra esquerda" dessa fauna de solteiros. Mal sabia eu que  especialistas gringos já estavam estudando compulsivos quarentênicos por matches como eu e alertavam que eu estávamos indo pelo caminho errado…

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Na teoria, me sentia a própria solteira darwiniana, provando que poderia me adaptar à evolução da espécie e, mesmo confinada, aprender a me virar na paquera virtual e ainda aproveitar a liberação dos tais "passaportes mundo" pra desenferrujar meu inglês e me jogar na paquera gringa (confesso que amo ruivos e hipsters e fui de cara configurando alguns apps pra Amsterdam ou pra Williamsburg em NYC). Um amigo uma vez me disse "apps de paquera são um jogo de números". Pois bem, me sentindo no cassino da solteirice, comecei a apostar todas as minhas fichas nesse jogo e fiquei expert em zapear rostos, tanquinhos e fotos de viagem numa velocidade frenética. 

Mas a verdade é que quanto mais eu me jogava nesse "Candy Crush" dos matches, mais sozinha e angustiada me sentia – Tava quase pior do que a fase em que maratonava as hard news… Eis que descobri esse estudo: os psicanalistas alertavam pro efeito rebote nos apps. Entendi tudo!! Tava ali vivendo esses efeitos colaterais.

Achei que era amor mas era tédio 

De acordo com a Dra Jennifer Rhodes a grande maioria das pessoas têm zapeado os crushes como uma tentativa de combater o tédio ou as próprias inseguranças: "Estamos num momento em que as pessoas estão assustadas e perdidas, ávidas por distrações. Por isso, sem perceber, a grande maioria dos solteiros não está em busca de alguém. Eles estão apenas usando os apps para não precisarem pensar no quão assustados e sozinhos estão". Doutora, a senhora acabou de me descrever. A reunião do trabalho no zoom tava um porre? Abria o Happn! A beringela no forno tava assando? Dá-lhe Inner Circle! As manchetes do jornal bateram tortas… zapeava no Tinder como eu zapeava o Netflix. O problema é que no Tinder não tem sinopses tão bem escritas, review dos usuários nem garantia de 327 horas ininterruptas de  puro entretenimento e emoção. 

Quero mas não quero 

Exatamente por estarmos usando os apps para "tapar o sol com os tanquinhos" a probabilidade que conversas se estabeleçam é muito baixa, de acordo com Rhodes. No discurso muitos solteiros dizem estar buscando amores significativos mas a verdade é que mesmo os mais românticos e carentes tendem a fugir nos novos laços.

A psicóloga conta que nesses momentos de incerteza, temos maior propensão a nos tornarmos evitativos. Ou seja, estamos avessos ao risco e não queremos nos colocar em nenhuma situação que saia minimamente de nosso controle. Assim, por mais que comecemos um papinho com um crush magia, tendemos a não dar continuidade ao flerte para evitar o risco de nos envolvermos e nos frustramos (olha ai o ghosting da pandemia sendo explicado!).

O tal efeito rebote 

Como a maioria das conversas não evolui, o efeito colateral dessa Las Vegas do amor é inevitável. Fiquei analisando meu comportamento: por mais que a maioria das minhas horas no app estivessem bem nesse modo piloto automático, a rebordosa emocional e a sensação de desamparo têm aparecido com cada vez mais força. Por que na minha lógica torta e insone, parecia que eu tava me dedicando à minha vida amorosa e o fato de não rolar nada legal aumenta a sensação de fracasso. 

Apenas para um grupo seleto

De acordo com a Dra Jennifer  Rhodes as únicas pessoas que deveriam usar os apps de paquera ativamente nesse período são as que estão num estado emocional e mental equilibrados e que estavam seguros e bem-resolvidos com suas próprias questões. Isso para evitar que depositemos nossas angústias e ansiedades nos coleguinhas desconhecidos. Li isso e pensei: Ou seja, ninguém né? Por que se após 100 dias você se considera uma pessoa focada e equilibrada… por favor lance um curso online sobre como conseguir essa façanha e enriqueça via zoom!

4h54 da manhã, ainda to fritando na cama. Me imagino como a versão "solteira no isolamento" daquelas velhinhas viciada em BlackJack em Las Vegas: saindo da noitada de jogos sem um tostão, com olheiras gigantes e uma ressaca moral. Olho o celular de novo. 5h12. Fecho os apps paquerativos e volto a abrir o app de mindfulness na esperança de manter o foco nas instruções do Yoggini. Só por hoje, como diria a senhorinha viciada de Vegas.

Se você quer saber como sobreviver à solteirice em tempos de likes, segue a gente no YouTube e no Instagram. Toda semana a gente entrevista solteiros, especialistas e divide nossos aprendizados e teorias. Mande histórias e dilemas que a gente transforma em pauta!

Sobre os autores

Piranhas românticas, André e Carol são experts em solteirice e partidários do afeto mesmo nas relações casuais. Carol está solteira há 6 anos e já não troca a aula de hot yoga por um date mais ou menos. André está solto monogâmico mas já se esbaldou muito na vida de contatinhos. Publicitários e roteiristas, trabalham com comportamento e conteúdo há anos e decidiram se aprofundar no tema que é assunto da manicure à terapia: como se relacionar hoje em dia. Comunicadores, puxam assunto até com o poste e são formados como psicólogos de boteco. Há um ano eles conversam com todo tipo de solteiros e especialistas no soltos s.a. um canal de youtube, instagram e, agora blog, pra explorar as dores e delícias dessa vida solta. Ninguém entende de solteirice como eles: já foram convidados pra falar na Casa TPM, na GNT e no podcasts Mamilos e Sexoterapia (aqui em Universa).

Sobre o blog

Um espaço para trocar estratégias para sobreviver à solteirice e aos relacionamentos em tempos de likes. Quando vale ter uma DR e quando podemos deixar morrer no silêncio? O que significa esse emoji? Assistir stories significa? Experts em solteirice e ótimos psicólogos de boteco, André e Carol compartilham dilemas reais de solteiros e mapeiam possíveis caminhos para não perder a sanidade mental nessa era de contatinhos.