Busca por agências de “casamenteiros” cresce 30%. Estamos pulando etapas?
Soltos S.A.
03/08/2020 04h00
fonte:br.freepik
Nós solteiros estamos mais carentes depois da quarentena? Estamos! Uma conchinha fixa nesse inverno faz falta? Muita! Seria bom poder desabafar sobre meu ataque de nervos desmedido com meu chefe no zoom enquanto tomo um vinho delícia com alguém que me ama, entende meus chiliques e faz massagem no meu pé? Óbvio que sim! Mas será que essa vontade de estar com alguém justifica uma corrida louca em busca de maridos e esposas? Porque é isso que está acontecendo no mundo, acreditem.
No Japão, a busca por agências de casamento cresceu 30% em comparação com o mesmo período do ano passado. Para conseguir se adaptar aos novos tempos, as duas maiores empresas do país (Sunmarie e O-net) estão até oferecendo seus serviços como encontros drive-thru, onde os solteiros paquerativos se encontram cada um em seu carro em estacionamentos vazios de cartórios de casamento. Se a coisa engrenar, é nesse mesmo cartório que eles se casarão (olha a pressão já no 1º date!!!). Segundo as empresas, só no último mês vários casais não só deram match, como deram entrada na papelada do casamento.
Não estamos pulando algumas etapas, produção?
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E se o mundo acabar amanhã?
"Todos aqueles que já pensaram em se casar um dia na vida estão se dando conta de que a hora é agora, aproveitem!" defende Kobayashi Jun da Universidade de Seikei, no Japão. O que, pra mim, soa como um anúncio de saldão do Black Friday, pelo visto tem mobilizado muita gente. Acho que rola um misto de medo de morrer sem ter realizado o tal sonho do casamento com a percepção de que a vida de periguetagem parece pouco segura e viável a curto e médio prazo. Com carnaval adiado, a pegação institucionalizada realmente tá mais difícil, mas será que precisamos correr desesperadamente rumo ao outro extremo?
Estabilidade e rotina voltando pra moda
Segundo a pesquisadora de tendências Amano Kanako do NLI Research Institute, esse misto de solidão e ansiedade gerado pela pandemia e pelas tragédias em geral faz com que a busca por um casamento seja vista como uma forma de garantir alguma segurança e estabilidade em meio ao caos. No Japão, após um 2011 trágico marcado por um tsunami, um desastre nuclear e um terremoto, as mesmas agências de casamento relataram um boom na busca por seus serviços.
Mas, ainda que a gente já saiba há tempos que o tal "felizes para sempre" é uma propaganda enganosa da Disney e de Hollywood (posso mandar a conta da minha análise pra eles?), parece que tem rolado uma vista grossa e um desejo de acreditar que o casamento nos garantirá paz, controle e acolhimento.
Não sei como estão os casais que vocês conhecem, mas os meus amigos casados não estão vivendo dias exatamente tranquilos. E se já tá difícil conviver e manter um casamento em histórias de gente que se conhece há tempos, quais as chances desses amores de drive-thru renderem uma vida de mar de rosas e álcool gel?
Talvez as agências de casamento não apresentem esse crescimento aqui no Brasil, mas tenho visto uma busca desenfreada rumo aos "amores da vida" que me parece tão equivocada quanto a procura pelos casamenteiros japoneses.
Amores inventados
Fico pensando o quanto estamos inflacionando os amores pra justificar a "furada" da quarentena e para buscarmos essa sonhada sensação de completude. Porque parece que furar o isolamento e se arriscar em nome de um amor verdadeiro é mais digno do que furar em nome dos nossos hormônios em ebulição e de um encontro de uma noite e nada mais. Quando qualquer embalagem de delivery não-higienizada pode trazer consequências drásticas pra nossa vida, a gente começa a querer que todos os encontros tenham "futuro" e que eles sejam o tal encontro perfeito alardeado por alguns furadores da quarentena que dizem ter encontrado o amor da vida.
Sei que existem casais que tiveram encontros mágicos durante o isolamento, mas também recebemos inúmeros relatos no inbox do soltos s.a. com histórias que pareciam romances fulminantes de filme que não renderam nem o tempo do trailer. Eu mesma confesso que já super projetei num match de Covid: o cara era cineasta, contou duas histórias trágicas da família e me mandou foto do pôr-do-sol. Foi tudo que precisei pra já sonhar que a coisa ia engatar, íamos nos encontrar na praia, viver o isolamento juntos filmando curtas-metragens sobre amor e conversando sobre nossas famílias bagunçadas na luz linda do pôr-do-sol da foto. Obviamente não rolou. E olhando pra trás vejo que a fantasia cabia bem pro meu momento de incerteza e insegurança e que a projeção tem rolado na décima potência sem que a gente se dê conta.
Acho válido a gente querer conhecer gente nova, querer paquerar, se sentir desejada. É claro que é gostoso conversar com alguém. Eu, que engato papos filosóficos até com meu pé de manjericão, tenho que me segurar quando um moço novo me manda um áudio fofo e divide um pouco do seu mundinho. Mas a gente precisa entender que é só isso. Duas pessoas isoladas, carentes, levemente desequilibradas, tentando se conectar um pouco. Não precisa ser o amor da vida, não precisa encontrar no estacionamento do cartório e casar depois de amanhã.
Até porque, se a gente já olha o crush como marido ou esposa em potencial nesse primeiro date, fica tudo mais pesado, não acham? Fica mais difícil ser espontâneo, deixar as coisas fluírem e até lidar com as imperfeições do outro. De repente estamos descartando muitos casinhos legais porque estamos fixados nesse ideal do amor da vida
Casamento efeito Cinderela
Mas nem tudo são flores…trazendo mais um dado do Japão pra abrir nossos olhos. Depois do tal boom de casamentos em 2012, o país viveu em 2013 um dos anos com maior queda no número de matrimônios. Ou seja, bastou a vida voltar minimamente ao normal que aquela vontade louca de juntar as escovas de dente e ser "feliz pra sempre" deu uma desaparecida. E se isso rolou com os japoneses, imagina com vai ser para a brasileirada, assim que anunciarem a data do novo Carnaval…
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Sobre os autores
Piranhas românticas, André e Carol são experts em solteirice e partidários do afeto mesmo nas relações casuais. Carol está solteira há 6 anos e já não troca a aula de hot yoga por um date mais ou menos. André está solto monogâmico mas já se esbaldou muito na vida de contatinhos. Publicitários e roteiristas, trabalham com comportamento e conteúdo há anos e decidiram se aprofundar no tema que é assunto da manicure à terapia: como se relacionar hoje em dia. Comunicadores, puxam assunto até com o poste e são formados como psicólogos de boteco. Há um ano eles conversam com todo tipo de solteiros e especialistas no soltos s.a. um canal de youtube, instagram e, agora blog, pra explorar as dores e delícias dessa vida solta. Ninguém entende de solteirice como eles: já foram convidados pra falar na Casa TPM, na GNT e no podcasts Mamilos e Sexoterapia (aqui em Universa).
Sobre o blog
Um espaço para trocar estratégias para sobreviver à solteirice e aos relacionamentos em tempos de likes. Quando vale ter uma DR e quando podemos deixar morrer no silêncio? O que significa esse emoji? Assistir stories significa? Experts em solteirice e ótimos psicólogos de boteco, André e Carol compartilham dilemas reais de solteiros e mapeiam possíveis caminhos para não perder a sanidade mental nessa era de contatinhos.